Não, não vou escrever de política nem de religião. Vou escrever sobre um escritor, uma pessoa que revolucionou a escrita em língua Portuguesa - de Portugal - sem acordos, sem atalhos. Embora por vezes polémico, alimentou enredos e desencadeou discussões sobre temas quasi intocáveis. Cravou na escrita a sua fé na descrença religiosa e com elegância mostrou-nos como do voto em branco se idealiza uma arma contra o poder instalado.
Amado em Espanha, mal amado em Portugal, mesmo após a sua morte, José de Sousa Saramago continua a ser tema de discussões académicas e homenagens à obra deixada. Curiosamente, este facto só interessa em Espanha, já que dali se lêem ecos da homenagem dedicadas ao único Prémio Nobel da Literatura Português na Feira do Livro de Guadalajara. Pela profundidade do comentário, permito-me transcrever um comentário de Raúl Padilla, o director da FIL2010, sobre o escritor Nobel: "Sus letras son espejos de la humanidad y con sus obras entendemos más de nosotros mismos."
Curiosamente, talvez por um problema interpretativo, talvez uma "incompatibilidade de software", elogios deste calibre só se ouvem da boca de hispano-falantes que não esquecem mencionar que o Nobel é Português.
Em Portugal censuraram-se os seus livros, atacou-se as suas ideias, depois do seu perecimento, discutiu-se da legalidade de espalhar as suas cinzas num jardim público, negou-se-lhe a homenagem pela atribuição do seu nome a uma rua... Enfim, aparentemente Saramago podia ter sido mais Português caso não tivesse criticado a Igreja e os costumes, caso não tivesse ido viver para Espanha; caso?!?!... Não vale a pena continuar.
Lamentavelmente em Portugal há escassos ecos na comunicação social sobre a riqueza cultural do país e das pessoas que estão por trás. Afinal, não é pelo Saramago que me revolto, mas pelo Portugal dos pequeninos e da hipocrisia.
4 comentários:
Caro Ferreira, M.S.,
Obrigado pela justa referência ao Prémio Nobel José Saramago que tanto honra a cultura portuguesa apesar de todas as provincianas e medíocres resistências internas.
Um abraço.
Cara Ana Paula Fitas
Obrigado por partilhar o meu ponto de vista. De facto a nossa sociedade vai muito mal. E não é porque temos o Fado e por isso somos coitadinhos, é mesmo porque não há vontade de mudar para melhor. Muitas vezes ouvi dizer o que em tempos da “Velha Senhora” alguém (supostamente do Clero) proferia: “deixai o Povo inculto, porque um Povo inculto é um Povo dócil". Nunca consegui chegar a comprovar se essa frase de facto era dita ou mesmo por quem, mas a mensagem, de tao clara, ainda hoje parece ter validade, se bem que afinal a nossa cultura também não avança porque não se quer ter trabalho – de ler, estudar, informar e discutir - coisas tao necessárias e que tanta falta nos fazem para abrir novos caminhos.
Abraço
Ferreira
Caro Ferreira
Mal vai um País que ignora os seus valores.
Acabei de escrever um comentário num post do Rogério Pereira "Conversa Avinagrada" em que confesso fazer parte daqueles, que só agora estou a descobrir em (grande parte) a importancia de muito daquilo que Saramago escreveu e disse, quando estava no mundo dos Vivos.
Abraço
Caro Folha Seca,
não posso concordar mais consigo, estamos mesmo muito mal de valores.
Um abraço
Ferreira
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